Especial: Entrevista exclusiva com Marcus Zanetti, médico veterinário da USP
Amigos, hoje eu converso com o pesquisador Marcus Antonio Zanetti, da USP de Pirassununga. Marcus formou-se em medicina veterinária na USP em 1976. Cinco anos depois, fez mestrado em Nutrição Animal na mesma universidade. Em 1984 concluiu o doutorado em Ciências dos Alimentos.
Atualmente Marcus trabalha na Faculdade de Zootecnia e Engenharia de Alimentos (FZEA), em Pirassununga, e junto com um grupo de pesquisadores, criou uma carne mais saudável, com menos colesterol e mais nutrientes, como selênio e vitamina E, dois importantes antioxidantes.
A ideia foi simples: mudar a alimentação do gado para obter uma carne de melhor qualidade.
Funcionou assim:
Durante três meses, 48
animais da raça Nelore (foto ao lado) foram divididos em quatro lotes de 12 animais.
Cada lote foi alimentado
com um tipo de ração diferente.
1. Milho e soja, sem fortificações.
2. Milho, soja e óleo de canola.
3. Milho, soja, Vitamina E e selênio.
4. Milho, soja, Vitamina E, selênio e óleo de canola.
Após o abate dos animais, o
resultado foi analisado em laboratório.
A carne do lote alimentado com óleo de canola, Vitamina E e selênio foi a mais saudável. Ela apresentou menos colesterol e teor de selênio seis vezes maior do que a carne convencional; a quantidade de Vitamina E também subiu: quatro vezes.
A carne do lote alimentado com óleo de canola, Vitamina E e selênio foi a mais saudável. Ela apresentou menos colesterol e teor de selênio seis vezes maior do que a carne convencional; a quantidade de Vitamina E também subiu: quatro vezes.
- Além de o
selênio e vitamina E diminuírem a morte celular e por isso retardarem o
envelhecimento, o selênio tem ainda um papel importantíssimo no combate às
infecções (temos vários trabalhos comprovando isto com animais) e já foi
verificado que ele pode atuar contra alguns tipos de cânceres - disse o
pesquisador.
Na segunda fase da
pesquisa, a carne obtida foi transformada em refeições
para 60 idosos de um asilo em Leme, interior de São Paulo. Eles comeram a carne três vezes por semana durante 90 dias.
Foi escolhido um grupo de idosos porque em geral eles apresentam queda da imunidade e anemia por deficiência de ferro e de proteínas. O estudo foi realizado com a autorização da instituição assistencial e dos responsáveis pelos idosos.
Foi escolhido um grupo de idosos porque em geral eles apresentam queda da imunidade e anemia por deficiência de ferro e de proteínas. O estudo foi realizado com a autorização da instituição assistencial e dos responsáveis pelos idosos.
Depois desse período, foram feitos exames de sangue com os idosos. O nível de colesterol deles diminuiu 13% e foi encontrada alta concentração de selênio no sangue.
Segundo Marcus Zanetti, a
produção de uma carne que possa melhorar ainda mais a nutrição e ter efeito
positivo no sistema imunológico das pessoas é um trabalho importante e de
caráter prático para a população em geral, para os agentes de saúde, nutricionistas
e para toda a cadeia produtiva da carne.
Abaixo você confere a
conversa completa.
De Olho no Campo: Para começar, gostaria que o senhor
explicasse o que o motivou a fazer essa pesquisa.
Marcus Zanetti: Há dois anos, realizamos
pesquisa semelhante com leite. Foi um trabalho de um orientando de
pós-doutorado, o Arlindo Saran Netto. Posteriormente surgiu a ideia de realizar
experimento com a carne.
Os principais objetivos das
duas pesquisas eram diminuir a gordura saturada e aumentar a insaturada e
enriquecer o leite e a carne com selênio e vitamina E. No experimento com leite
foi utilizado óleo de girassol. No experimento de carne foi utilizado óleo de
canola por ser mais rico em ômega três.
O experimento com carne
também foi realizado por uma orientanda de pós-doutorado, a Lisia Bertonha
Corrêa. Ela já havia sido minha orientada de doutorado e trabalhado também com
carne e colesterol, só que ao invés de selênio nós utilizamos no outro trabalho
dela o cobre.
"Esta é uma linha praticamente inédita no mundo e de grande importância, não só por isso, mas por destacar a importância de quem trabalha com animais para a saúde do homem".
Em quanto tempo foi realizada a pesquisa, desde
o começo da alimentação suplementada para os animais até a carne ser provada
pelos idosos em Leme?
A pesquisa já está com dois anos e ainda não
foi concluída. Estão faltando algumas análises de vitamina E e análises
estatísticas.
Essa pesquisa foi apresentada em países como
Turquia, Cuba e França. Quais foram as reações e comentários das pessoas
presentes ao terem contato com essa pesquisa?
Nos congressos citados os resultados eram parciais,
não tínhamos os resultados que temos hoje, mesmo assim a reação foi muito boa,
principalmente a parte do colesterol dos animais.
Esses países desenvolvem
pesquisas semelhantes? Como o senhor avalia o desenvolvimento do Brasil neste
tipo de pesquisa, em comparação com outros países?
Praticamente inexiste
pesquisa semelhante utilizando animal e humano e até agora não encontramos
nenhuma pesquisa igual à nossa com suplementação de selênio e redução de
colesterol, daí o ineditismo. Neste aspecto parece que estamos mais adiantado
que os outros países, o que é muito bom.
Quais as
principais diferenças nutricionais entre a carne convencional e a carne
proveniente dos bois com alimentação enriquecida?
Estamos concluindo as
análises de ácidos graxos, portanto não podemos afirmar se houve algum efeito
na gordura. Até agora temos um aumento no selênio e na vitamina E, uma redução
no colesterol e uma diminuição na oxidação da gordura, ou seja, um aumento na
vida útil da carne.
"Não basta somente demonstrarmos as qualidades e os possíveis benefícios do leite e da carne enriquecidos, é importante que haja uma regulamentação pelos órgãos competentes. Esperamos que estes estudos possam ajudar o Ministério da Agricultura e a ANVISA a tomarem as medidas necessárias".
O senhor também
fez parte de uma pesquisa parecida, a respeito da produção de leite. Essa
suplementação na alimentação dos animais poderia ser feita por produtores
interessados? E isso poderia ser rentável?
Eu tenho trabalhado com
suplementação mineral no leite e na carne há tempos, mas as duas últimas
pesquisas tiveram uma repercussão maior.
O experimento de
enriquecimento do leite foi divulgado há cerca de dois anos e apesar de que até
agora não houve regulamentação pelos órgãos responsáveis, tem uma grande
empresa querendo colocar o leite enriquecido no mercado.
Na época da divulgação
muitos produtores entraram em contato para saber como obter o leite
enriquecido. Tenho conhecimento de produtor que já está colocando o leite no
mercado, mas não pode colocar no rótulo que é enriquecido...
Sobre ser rentável, o que
posso afirmar é que a demanda por produtos enriquecidos e saudáveis é cada vez
maior e infelizmente o Brasil está muito atrasado neste aspecto, nos
Estados Unidos e na Europa estes produtos são bastante comuns, mas aqui
ainda não. Sobre a carne enriquecida que está sendo divulgada agora já
existe interessado na técnica.
E quais os benefícios de
uma dieta com vitamina E e selênio no organismo?
Tanto o selênio quanto a
vitamina E são antioxidantes. Apesar disso, eles atuam de forma totalmente
diferente. A vitamina E atua mais prevenindo a oxidação enquanto o selênio atua
destruindo os radicais livres formados.
Além de eles diminuírem a
morte celular e por isso retardarem o envelhecimento, o selênio tem ainda um papel
importantíssimo no combate às infecções (temos vários trabalhos comprovando
isto com animais) e inclusive já foi verificado que ele pode atuar contra
alguns tipos de cânceres.
Quais foram as reações das pessoas ao provarem a carne produzida pela FZEA?
As pessoas que provaram a carne aprovaram prontamente, um dos motivos pode ser porque estavam acostumadas a consumir carne comum, mas o outro motivo pode ser o efeito antioxidante do selênio e da vitamina E na carne que diminuíram a oxidação. Já existe trabalho na literatura relacionando diminuição na oxidação com melhora no sabor da carne.
As pessoas que provaram a carne aprovaram prontamente, um dos motivos pode ser porque estavam acostumadas a consumir carne comum, mas o outro motivo pode ser o efeito antioxidante do selênio e da vitamina E na carne que diminuíram a oxidação. Já existe trabalho na literatura relacionando diminuição na oxidação com melhora no sabor da carne.
O De Olho no Campo agradece pela entrevista de Marcus Zanetti. E agradece também pelas fotos, tiradas por Lisia Correa.